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A EMPATIA COMO EXPRESSÃO DA INTELIGÊNCIA AFETIVA – Por Maria Idalice Silva Barbosa

A EMPATIA COMO EXPRESSÃO DA INTELIGÊNCIA AFETIVA

Maria Idalice Silva Barbosa[1]

A empatia, como função psicológica, não é plenamente desenvolvida porque a sociedade moderna fundamenta suas relações sociais, prioritariamente, pela racionalidade, em detrimento da afetividade. Valorizamos a razão e damos pouca, ou nenhuma atenção as emoções e sentimentos presentes em nossas relações. Somos educados em uma racionalidade que nos distancia como humanos, e formos abandonando formas mais sensíveis de convivência e interação social, ou seja, aprendemos mais a lidar com objetos e máquinas, e pouco, com pessoas e relações.

Fomos educados para temer nossas emoções, e não nos conectarmos a elas, permanecendo alheios ao que sentimos. O resultado é uma incapacidade de entender o quê, e como, nos sentimos em relação as pessoas e situações diversas de interação social, embotando nossa capacidade empática. A empatia, porém, está presente em todos os seres humanos podendo ser entendida como uma capacidade de se colocar no lugar do outro, de re-conhecer suas emoções e sentimentos, e assim, construir um saber capaz de decifrar o modo como o outro se sente em relação a diferentes situações, sejam elas agradáveis ou desagradáveis. Trata-se de uma função natural, próprio do nosso organismo humano em sua sensibilidade, forjada por um longo processo evolutivo de convivência social.

É comum confundir e/ou reduzir empatia à simpatia, um estado que resulta de uma reação mais superficial de identificação com algumas pessoas em específico, porque percebemos nela, uma presença agradável, traduzida em gentileza, sorrisos e carisma. A diferença entre a empatia e a simpatia consiste, justamente, no fato de que a simpatia acontece na interação social com algumas pessoas, especialmente. Já a empatia é uma função psicológica, e como tal, está presente em todos os seres humanos. Geralmente, simpatizamos com pessoas empáticas, precisamente, por sua capacidade maior de estabelecer uma conexão afetiva. É importante salientar, porém, que esta capacidade empática pode e deve ser desenvolvida, sendo o resultado disso uma maior qualificação de nossas interações sociais que passam a ser marcadas pela presença de mais simpatia, solidariedade e gentileza.

A empatia se desenvolve em função do cultivo e durabilidade de nossos laços afetivos, possibilita enriquecer e aprofundar nossos vínculos com o outro, consigo e com o mundo, estabelecendo relações sociais mais baseadas na solidariedade e compaixão, qualidades próprias da operacionalização de nossa inteligência afetiva.

 

O cultivo da empatia na interação social

Um caminho para desenvolvermos nossa capacidade empática é aprofundar e ampliar nosso modo de vinculação consigo e com o outro. A linguagem é nossa principal fonte para nos comunicar e, assim, compreender e decifrar o mundo que nos cerca. Nossas formas de comunicação, porém, estão mais centradas na compreensão do mundo dos objetos do que das interações sociais.

Geralmente, o que acontece é que os mesmos mecanismos que recorremos para entender o mundo dos objetos, também deles fazemos uso, para compreender o mundo das relações sociais, e acabamos facilmente caindo em incompreensões. Isso acontece porque pouco recorremos a empatia como função psicológica. Assim, por exemplo, é comum usarmos nossas habilidades de classificar, categorizar e generalizar, para compreender as relações sociais e enquadrar as pessoas com base em valores sociais e culturais, separando-as em grupos: ricos, pobres, brancos, pretos, inteligentes, bonitos, feios. É comum ainda generalizar e cristalizar pessoas de determinada maneira, por pertencerem a algumas destas categorias, e dela tomarmos distâncias na convivência, por raramente usarmos nossa capacidade empática para nos conectarmos com elas, e compreendermos de forma mais ampla e profunda, sobre o seu mundo e seu contexto social e cultural. Nossa capacidade empática é o que nos faz enxergar as semelhanças integrando as diferenças, porque não recorre a classificações e generalizações.

Fazemos isso em função de processos de socialização e educação que separa e antagoniza racionalidade e afetividade. A presença dessa dicotomia na sociedade gera um distanciamento entre as pessoas e empobrece nossas relações. Isso se expressa de forma mais ampla por meio da linguagem que cotidianamente fazemos uso para estabelecer uma comunicação com o outro, somado ainda o fato de raramente utilizarmos a linguagem para nos conectar e comunicar-se consigo próprio. Por isso, é importante refletir: é possível construir formas de comunicação capaz de mais vinculação empática e menos distanciamento e separação, consigno e com o outro?

Um primeiro passo para qualificarmos as relações sociais é aprofundar o vínculo consigo mesmo, e o caminho para isso é estabelecer uma conexão direta com nossas emoções e sentimentos. A emoção pode ser entendida como uma resposta corporal da interação com o outro em situações específicas. Elas são a matéria prima que compõem os nossos sentimentos, que por sua vez, são elaborados na medida em que tomo consciência sobre o significado da emoção presente, por meio da integração entre o pensar e o sentir.

Se não entramos em contato com as emoções, não podemos decifrar o que sentimos, e tampouco, somos capazes de compreendê-los e comunica-los. Como o sentir está na base de nossas relações sociais, criamos e vivemos em um mundo de incompreensões mútuas e distanciamento afetivo.

Geralmente nossos sentimentos se vinculam com nossas crenças mais profundas, e estão ligados à memória da nossa família e/ou da nossa espécie. É comum entendermos uma situação racionalmente de uma maneira, e sentirmos de outra, pois as emoções relacionadas com a situação ainda não foram compreendidas, ou seja, não chegou à consciência.

O mundo das emoções e sentimentos tem permanecido obscuro para a maioria das pessoas, trata-se um terreno delicado que, ao esforçarmo-nos para melhor compreendê-lo, desenvolvemos ao mesmo tempo, nossa inteligência afetiva expressa por uma capacidade empática. O primeiro passo nesta direção é fortalecer o vínculo consigo estreitando a comunicação consigo mesmo no sentido de decifrar os sentimentos presentes em nosso coração, atentando-se para as emoções que as diversas situações desencadeiam em nós. O quadro abaixo apresenta uma classificação que ajuda a compreender a complexidade do mundo emocional e sentimental.

 

Grupo Resultam de experiências da vida Exemplos – Emoções e sentimentos
ACOLHIMENTO Que contribuem para manutenção de nossos vínculos de maior proximidade para formar pares, família, conviver em grupo

 

Afeto: sentimento de ligação dedicado ao outro

Simpatia: sentimento de identificação com o outro

Desejo sexual: atração pelo outro e desejo de compartilhar o prazer de viver

Fraternidade: sentimento de comunhão mútua que envolve inclusão e pertencimento.

Amizade compartilhar mútuo de afeto que envolve o querer bem sem pensar em receber algo em troca.

CONFRONTO Que são ligadas a acontecimentos em que somos ameaçados em nossa sobrevivência ou confrontados em nossas crenças e visões de mundo Medo: reação natural frente a um possível dano;

Raiva: disposição para o confronto ante uma situação, ou quando o “inimigo” surge;

Ansiedade: antecipação de algo ameaçador;

Mágoa: resultado da ferida de um confronto

COMPARAÇÃO Que são ligadas à nossa rede de interrelações pessoais e sociais Orgulho:  me sinto vaidoso de mim mesmo, me sinto superior porque faço ou tenho coisas que outros não fariam ou não tem;

Inveja: sofrimento por se sentir injustiçado porque o outro tem o que não tenho. Não consigo compartilhar da felicidade do outro por ter o que tem, ou fazer o que faz;

Inferioridade: olho o outro e não é bem o que ele tem que me faz sofrer, e sim, a grandeza que atribuo ao outro que provoca um sofrimento em mim

EXCLUSÃO Que são ligadas a pessoas ou grupos diferentes que não (com)partilham com seu grupo de origem Discriminação: segregar pessoas ou grupos em função de diferenças: biológicas, religiosa, ideológica, geográfica;

Preconceito: intolerância e hostilidade gerada pela generalização apressada de uma experiência pessoal ou crença imposta pelo meio;

Ódio: aversão intensa motivada por medo, raiva ou injúria sofrida.

PERDA

 

Que são ligadas a pessoas ou acontecimentos envolvendo dramas vividos com intensidade Desespero: iminência de que uma perda vai se suceder, e me sinto impotente diante disso;

Ciúme: perda de um lugar especial na vida ou no sentimento de um outro especial para mim;

Luto:  a mais profunda das emoções de perda.  Estado de tristeza e de despedida de diante de uma perda consumada;

PLENITUDE Relacionadas a conexão com algo maior Paz: estados difusos de quietude, de reconhecimento da grandeza do existir;

Comunhão: sensação de pertencimento a uma comunidade, sentimento de integração a espécie humana;

Generosidade: sentimento positivo de alegria e libertação (sofrimento ou opressão), seja sua, ou dos outros conhecidos e desconhecidos.

A capacidade de identificar qual a emoção está em si e no outro, em diferentes situações, e aprender a distinguir os sentimentos que resultam de tais experiências, é uma compreensão que nos ajuda a adequar nossas reações, saindo de reatividades automáticas e emocionalidades que nos prendem em dramas, para ampliar nossa consciência sobre a relação que fazemos entre o que pensamos, sentimos, cremos e defendemos em nossos discursos, e as atitudes que, de fato, tomamos em nosso cotidiano.

 

[1] Maria Idalice Silva Barbosa, psicóloga, PhD em Abordagem Sistêmica de Família, doutora em Saúde Coletiva, Mestre em Educação e especialista em Educação Biocêntrica, facilitadora de Biodança e Consteladora Familiar Sistêmica.

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