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BIODANÇA NO SALÃO DA VIDA – por Ruth Cavalcante

 

Peço licença para ocupar esse espaço aberto pela ABRAÇA para fazer um relato de vivência que espero seja recebido com a mesma compreensão que sempre temos no momento de Intimidade Verbal, o que espero até mesmo daqueles que pensam diferente mas, todos/as com abertura para a escuta.

Trata-se de um assunto já veiculado exaustivamente pela mídia com imagens, fotos, informações e comentários. Mas o que desejo trazer aqui é o meu Relato de Vivência sobre o significado dos  eventos de 1º de Janeiro de 2023.

Falo a partir da visão de uma integrante da Comunidade Biocêntrica, facilitadora didata e diretora da Escola de Biodança, onde atuo há mais de 40 anos que já viveu todo tipo de emoções nesta  caminhada, como todos/as nós facilitadores/as.

Pois, é de emoção e sentimentos que quero falar, da forma que aprendemos na nossa formação, sem medo de vivenciar com intensidade. Sempre entendi que nossas vivências não se restringem ao salão, onde nos preparamos para viver os princípios desse sistema no nosso cotidiano e na sociedade como um todo, para isso dançamos o poema::”todo artista deve ir aonde o povo está”. Assim entendo o vínculo com a totalidade. Foi apoiada nessa compreensão que participei da 1ª Posse do Presidente Lula em 2003, com a alegria de uma cidadã comprometida com o coletivo. Mas agora, 20 anos depois, o sentimento vivido foi de tal grandeza que me levou a uma vivência de transcendência. Em meio a uma multidão de mais de 300 mil pessoas irmanadas no mesmo sentimento de harmonia e paz, vivi o verdadeiro espírito comunitário numa renovada felicidade. Choramos e cantamos juntos muitas das músicas  celebrativas  que dançamos no salão, com a mesma fluidez, com pessoas com as quais estávamos nos encontrando pela primeira vez, que compartilhavam espontaneamente emoções e alimentos. Aquela multidão aglomerada, como em num grupo compacto no coração dos poderes na Esplanada dos Ministérios, rodeada dos Palácios esbanjando, arte arquitetônicas sem muros  nem grades pura poesia da obra de Niemeyer. O  patrimônio cultural do nosso país, mas que não pertence apenas ao povo brasileiro quando foi tombado como patrimônio da humanidade. A  expressão da arte curando a alma como aprendemos com nosso mestre Rolando Toro. Ali não predominava mais o medo, as ameaças propagadas no final do ano passado.  Estávamos resgatando tudo que nos fora negado durante amargos 6 anos. Voltamos a ocupar os espaços públicos confiantes no novo tempo que ressurgia com respeito a vida em todas as suas manifestações na minha ótica (ou desejo) inspirada no Princípio Biocêntrico.

Retomamos a esperança de estabilizar a nossa jovem democracia conquistada a duras penas, era a certeza de que estávamos diante de uma vitória histórica reconhecida , não apenas por nós ali presentes, mas pelo mundo ali confirmado por chefes de Estado representantes de organismos internacionais de muitos países em  quantidade nunca visto em outras posses.

A transmissão da faixa, que deveria ser apenas uma cerimônia protocolar, transformou-se num ritual ancestral levando todos os presentes ao delírio no  momento da subida da rampa do Palácio do Planalto. Ali se sinalizava o que seria o novo tempo.  A caminhada do Presidente acompanhado dos “invisíveis”, diversos segmentos da nossa nação antes  relegados ao descaso, discriminação e exclusão: os povos originários na figura do velho cacique, os negros adultos e crianças, as mulheres , o professor (aí me vi)  a pessoa com deficiência (no qual me veio a Mariana,) o artesão incluindo ainda os animais na figura simbólica da Resistencia, cena que nos levaram mais um vez às lagrimas. Lembrei da facilitadora Cecília Borelli no seu poema, a Rolando Toro que tornou-se um clássico: ” E ele sorrindo, tomou a mão de cada um e os encaminhou para o grande salão, e a luz de seu coração foi dividida igualmente entre todos que estavam presentes…os impotentes, os onipotentes,, os desiludidos, os  iludidos, os carcomidos, os remanescentes…gente de toda cara, de toda tara, de toda fé, de toda beleza, de todo corpo e alma…” (Cecília Borelli : ” O mar e o Mestre dançarino” pag. 14)

Quando o Presidente recebeu a faixa das mãos negras de uma mulher, tendo passado pelas mãos de todos, recebeu a missão de governar esse mesmo povo. Foi um ritual emblemático que permanecerá eterno em nós Venceu não apenas o Lula  vencemos todos/as nós, venceu a democracia.

Já empossado, Lula proferiu o seu 3º  discurso e aquela multidão sentou-se na grama como pedindo proteção à mãe terra. E fez-se um silêncio comovente para beber as palavras de um ex-operário, um ex-preso político (e aí de novo me vi) um ex-presidente. Um silêncio de profundo respeito deu  até mesmo para ouvir as batidas de nossos corações.

Sentimo-nos convocados a  reconstruir nosso país quando ele pediu comovido: ” por favor me ajudem, não só a governar, mas a cuidar do povo mais necessitado” e concluiu afirmando:” a esperança venceu o medo e o Amor derrotou o ódio”.

Depois de tudo que ouvi, vi e senti  tomou conta de mim um sentimento de profunda gratidão por todos/as que deram um pouco de si para chegarmos a esse momento e a mim pessoalmente por ter tido o privilégio de viver tão intensa vivência tal qual vivi tantas vezes no salão Não pude deixar de, mais uma vez, encontrar semelhanças com o que vivenciamos nos nosso grupo de Biodança e nas Vivências Pedagógicas de Educação Biocêntrica

E tudo se completou quando fui convidada por algumas Facilitadoras de Biodança de Brasília para que eu facilitasse uma sessão do que chamamos na Educação Biocêntrica, celebração da Colheita. Iniciamos com uma vivência Pedagógica usando o Círculo de Cultura fazendo uma reflexão com palavras-geradoras relativas ao tema: “Viva a democracia dançando a esperança e os vínculos afetivos “.

E dançamos a arte do encontro em muitas rodas afetivas, alegres e euforizantes

Para concluir esse Relato de Vivência trago a presença do nosso mestre Rolando Toro que expressou em seu livro “Balada del Angel Caído” todo o horror dos anos de chumbo durante o golpe e a ditadura de Pinochet.

 

Dulce Patria

A nosotros, dinastia milenaria,

nos basta un poco de sol e amistad.

 A nosotros, sonadores errantes,

con caras de animales tristes

nos basta un vaso de vino en noche de invierno.

 No tenemos necessidades,

nuesra riqueza es nuestra pobreza,

nuestra casa se levanta en el corazón

 En la perfecta cerimonia de ingratitud

perseguidos e maltratados,

nos basta um poema para dormir em paz

 Dulce Patria en los  ojos

tan extensa en la esperança 

No cantaré tus glorias militares

sino los versos de Rosamel.

 

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